As minas de Potosí impactam durante o mochilão pela Bolívia.
Potosí, na Bolívia, foi o lugar que mais me colocou para pensar durante os cinco meses que passei mochilando pela América do Sul.

O Cerro Rico, a montanha de prata em torno da qual cresceu Potosí, a cidade mais alta do mundo
A verdade é que muitas atrações frequentadas por turistas não são propriamente turismo. Potosí é o maior exemplo que conheci de não-turismo como viajante. Afinal, não há recreio ou lazer quando se conhece um lugar como as minas do Cerro Rico, a montanha que faz a fama local. Mas é definitivamente tocante.
A cidade já foi um dos lugares mais ricos do mundo. Aliás, chegou a rivalizar com a capital do reino espanhol, Madrid, durante a colonização. Atualmente, faz parte do mais pobre estado da miserável Bolívia, também chamado de Potosí.
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Cerro Rico – Potosí

A cidade de 140 mil habitantes vista do alto: Potosí já foi mais rica do que Madri
Assim, o Cerro Rico, a montanha que cospia prata e ainda engole homens, fez a fama do local e continua sendo o principal motor econômico da região e é o principal destino dos turistas na área.
O que fazer em Potosí
É certo que, em Potosí, existem coisas mais bonitas que a visita ao Cerro Rico. No entanto, poucas experiências na América do Sul marcam tanto quanto entrar nos túneis nos quais ainda trabalham milhares de pessoas –e morrem dezenas todos os anos.
O centro colonial de Potosí tem igrejas e prédios coloniais interessantes, mas admito que nada me saltou aos olhos, apesar de a cidade boliviana ser um patrimônio mundial da Unesco.
Não foi uma visão profunda, fiquei pouco tempo no lugar. Como para muita gente, Potosí só fez parte do meu roteiro de viagem como um pit stop obrigatório. Meu destino era Tupiza, uma cidade no sul da Bolívia que também é ponto de partida para o tour no Salar de Uyuni. Não cheguei a dormir em Potosí.

Há igrejas e construções interessantes no centro histórico de Potosí

A cidade boliviana é Patrimônio da Humanidade pela Unesco
Por sinal, é comum quem está viajando pela Bolívia, principalmente mochileiros, só passar em Potosí como um pit stop para ir a cidade de Uyuni.
O Salar de Uyuni é o principal destino turísitico da Bolívia e um dos mais famosos cartões-postais da América do Sul. Aliás, não por acaso, o deserto de sal é chamado de parque de diversões de fotógrafos pelas belezas. Igualmente, outra coisa que faz a fama de Potosí é a altitude: a 4.090 metros, o que é muito alto até para os Andes, a cidade é um dos centros urbanos mais altos do planeta. Vai faltar ar.
E apesar de todo o peso histórico e da realidade do dia a dia (o passeio nas minas, ainda em funcionamento e ainda matando muita gente, é assustador), Potosí é mais um patrimônio da humanidade pela Unesco que valeu a pena conhecer no mochilão pela América do Sul.
As minas de Potosí
Primeiramente, só decidi fazer o passeio pelas minas de Potosí em cima da hora. Os tours saem diariamente pela manhã e custam em torno de 100 bolivianos, com transporte até as minas, equipamento de segurança e guia.

Depois fiquei mal por tirar uma foto comemorando com essa roupa, mas náo tinha ido até as minas
Cheguei em Potosí de manhãzinha e vi o horário de ônibus para Tupiza, quase na fronteira da Argentina. Os ônibus só saíam à noite, então teria que ficar o dia inteiro na cidade a 4.000 metros de altitude e frio de rachar em julho.
Pedi um táxi até o centro histórico e esperei uma agência de turismo abrir para contratar o passeio. Após acertar tudo –tem que assinar até um documento de responsabilidade, porque andar nas minas tem, sim, perigo real– nos reunimos com nosso grupo.
Rota para o inferno: as minas de Potosí
A primeira parada no tour para as minas em Potosí, feito em parceria entre agências de viagens e cooperativas de mineiros, é para colocar o equipamento de segurança: macacão grosso, capacete com lanterna, botas. Depois, conhecemos uma fábrica de refino de prata. A coisa já fica mais assustadora:
— as refinarias de minério da Bolívia são medievais
O barulho das máquinas trabalhando, o cheiro de produto químico que deixa denso o ar rarefeito de mais de 4 mil metros de altitude, a completa e visível falta de segurança e os trabalhadores mineiros explorados há séculos. É bem desconfortável imaginar que tem gente que trabalha ali diariamente.
As oficinas só não podem ser chamadas de o inferno na terra porque o inferno vai ser conhecido dali a pouco e fica embaixo da terra, nas entranhas do Cerro Rico, a ‘montanha que engole homens’, uma das designações mais famosas do morro.

As refinarias de prata são assustadoras

A segurança é mínima
Contaminação por mercúrio, desmoronamentos, mortes por silicose: os trabalhadores da prata em Potosí ainda convivem com muitos dos flagelos que mataram mais de 8 milhões de escravos indígenas e africanos durante a colonização espanhola entre os séculos 16 e 19.
O estudo está no livro de Eduardo Galeano “As Veias Abertas da América Latina” — uma obra muito interessante para inspirar em uma viagem pela América do Sul, está na bagagem de muitos mochileiros.
Hoje a prata já não é tanta, mas estima-se que nos séculos 16 e 17, até metade desse minério no mundo era extraída dali. Agora, as cooperativas de mineiros lutam para continuar extraindo quase sem nenhuma tecnologia moderna o que resta de prata nos túneis abafados e escuros das quase duas centenas de minas de Potosí, na Bolívia.
Tour pelas Minas de Potosí
O tour nas Minas de Potosí prossegue.
Antes de entrar em um buraco, o tour para em uma pequena vila mineira para conhecermos os mercados mineiros. É lá onde os trabalhadores se abastecem antes de ir às minas.

O mercado de mineiros onde dá para comprar presentes para os trabalhadores
De álcool potável com graduação de quase 100% para beber (que pode ser tomado puro, mas é normalmente misturado com água), dinamite, equipamentos de segurança e comida. Assim, os trabalhadores de Potosí compram material, por conta própria, para a exploração do minério de prata.
Os turistas são convidados a comprar presentes para os operários, que são entregues por meio do guia. Então, os presentes são coisas úteis, produtos para serem consumidos no dia a dia. Pode ser bananas de dinamite ou água para beber, por exemplo.
Em seguida, adentramos às minas!
Na entrada, o vai e vem barulhento e o choque violento de carrinhos lotados de pedra. Por sua vez, os trabalhadores concentrados, sujos e com as bochechas lotadas de folhas de coca para aumentar o vigor físico. Aliás, todos, sem exceção, parecem ter as bochechas deformadas pela mastigação da coca, e o semblante cerrado não deixam dúvidas que o trabalho é difícil.
Carrinhos lotados de pedra

Os trabalhadores das minas esperam para entrar nos túneis

As folhas de coca são importantes para aguentar o trabalho desumano

Tio, o deus dos mineiros e senhor das entranhas da terra

Ar quente, viciado, corredores apertados, barulho etc. etc. etc.

O trabalho é duro e não rende muito
Ficamos quase uma hora dentro das minas, e não é fácil andar. Assim, o ar vai ficando cada vez mais viciado, e muitas vezes é preciso esgueirar-se para ver os carrinhos lotados de pedra passarem pertinho. Já outras vezes é preciso correr para abrir caminho aos grupos de trabalhadores e seus carrinhos. Além disso, o ambiente é escuro e sombrio.
Tão sombrio quanto o deus dos mineiros, encontrado em capelas rústicas aberta nas pedras: Tio. O senhor das minas de Potosí, não por acaso, lembra a imagem clássica do diabo. É ele quem protege a vida nos túneis escuros do Cerro Rico, em Potosí, Bolívia, América do Sul.
Por fim, para não errar na próxima viagem internacional, confira todo nosso conteúdo, com dicas de viagens, passeios, roteiros e hotéis. Assim, viaje com os relatos de quem realmente entende de turismo e esteve no local. Tire dúvidas, troque ideias e experiências.
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